Jacinta Velloso Passos nasceu em 30 de novembro de 1914, na Fazenda Campo Limpo, no município de Cruz das Almas, no Recôncavo Baiano. Vinda de uma família tradicional e politicamente influente — seu avô, Themístocles da Rocha Passos, foi senador da República — cresceu em um ambiente marcado por fortes valores políticos, intelectuais e culturais.
Em 1924, aos 10 anos, mudou-se com a família para São Félix e, mais tarde, para Salvador. Na capital baiana, estudou na Escola Normal da Bahia, onde se formou em 1932 com destaque, sendo a melhor aluna em matemática. Foi nesse período que começou a escrever seus primeiros versos, inicialmente com temas religiosos, reflexo de sua sensibilidade e de uma religiosidade marcante na juventude.
Durante a década de 1930, passou a frequentar os círculos literários de Salvador, especialmente a Ala das Letras e das Artes (ALA), ao lado de seu irmão Manoel Caetano Filho. Seus poemas logo conquistaram o reconhecimento da intelectualidade local, consolidando sua presença no cenário cultural baiano.
Com o avanço da Segunda Guerra Mundial, Jacinta engajou-se em movimentos antifascistas e pacifistas, aproximando-se de grupos de esquerda. Em 1942, publicou com seu irmão o livro “Nossos Poemas”, que marcou sua entrada formal na cena literária. Dois anos depois, mudou-se para São Paulo, onde se casou com James Amado, irmão do escritor Jorge Amado. Lá, estreitou relações com importantes nomes da cultura e da política, como Oswald de Andrade e Sérgio Buarque de Holanda.
Em 1945, lançou o livro “Canção da Partida”, ilustrado por Lasar Segall, recebendo elogios da crítica especializada. No mesmo ano, filiou-se ao Partido Comunista Brasileiro (PCB) e candidatou-se a deputada federal pela Bahia. Embora não tenha sido eleita, seu compromisso com as causas populares e a justiça social tornou-se cada vez mais evidente, refletido em sua produção literária e nas suas ações públicas. Em 1951, publicou “Poemas Políticos”, obra que entrelaça lirismo e engajamento, denunciando desigualdades e defendendo utopias sociais.
A partir desse período, começaram a circular discursos que buscavam desqualificar sua atuação política, muitas vezes associando sua conduta a supostos distúrbios mentais. Em um contexto de crescente repressão — especialmente contra militantes de esquerda e mulheres — essas narrativas serviram como estratégia para silenciar sua voz. Ainda assim, Jacinta seguiu escrevendo e publicando. Em 1957, lançou “A Coluna”, um poema épico sobre a Coluna Prestes, reafirmando sua firmeza ideológica.
Ao longo dos anos 1960, viveu em cidades como Petrolina (PE) e Barra dos Coqueiros (SE), onde manteve sua militância política. Em 1965, já sob o regime militar, foi presa após pichar mensagens de protesto contra a ditadura em muros de Aracaju. A prisão ocorreu por militares do 28º Batalhão de Caçadores. Pouco depois, foi institucionalizada sob a alegação de incapacidade mental — uma narrativa imposta pelo regime como tentativa de neutralização política. Jacinta permaneceu internada até sua morte, em 28 de fevereiro de 1973, aos 57 anos.
A vida de Jacinta Passos não foi moldada para agradar — foi feita para confrontar. Mulher, poeta, militante e inquieta, ela escreveu com a coragem de quem não separa palavra e ação. Enfrentou a intolerância, o autoritarismo e as tentativas sistemáticas de apagamento com lucidez e convicção. Sua obra permanece como registro da luta de uma geração que ousou sonhar com justiça social e que pagou caro por isso. Jacinta não é memória suavizada: é denúncia viva, é poesia em estado de combate.
Por David Souza
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